Problemas de arrasto, tal como eu os entendo, são problemas que são consequências de um determinado comportamento. Neste texto, vou falar de um problema de arrasto que eu tive, derivado à minha adição aos jogos online.
Muitas vezes, quando falamos sobre a adição aos jogos online, focamo-nos muito apenas na questão financeira. O dinheiro que é perdido, o dinheiro que é ganho e que se torna a perder. Mas há muito para além disso. Vou contar um episódio que aconteceu comigo.
Há cerca de 22 anos atrás, estava eu no liceu, no 9° ano de escolaridade, quando comecei a fumar. Eramos um grupinho de 4 ou 5, às vezes mais. Não tínhamos dinheiro, nem idade para comprar tabaco, então juntávamos os trocos que os nossos pais nos davam e pedíamos a alguém mais velho para comprar por nós. A cada intervalo entre aulas, lá íamos nós para trás do ginásio fumar um cigarrinho. Nem “trancar” sabíamos.
Em Junho, tinha eu 14 anos, quase no final do ano letivo, já em altura de provas globais, decidi faltar à última aula da manhã, que era de História, e ir para casa. Quando cheguei a casa, a minha mãe pediu para eu ir com ela pagar uma fatura de eletricidade, na antiga casa da luz, e lá fomos. Fiz o pagamento enquanto a minha mãe esperava por mim no carro. Quando ia atravessar a estrada, estava a guardar o recibo no bolso das calças, numa berma à beira da estrada, mas que era nivelada com a mesma, quando fui colhido por um carro. Resultado: parti uma perna, fiz um corte no lábio e fiquei inconsciente durante uns segundos. Fui evacuado para o Hospital, na Madeira, onde me colocaram gesso.
Estive 3 meses em casa e, como óbvio, não podia fumar. Tão rápido comecei a fumar um cigarro, como deixei de o fazer.
Avançamos até 2010 ou 2011, e eu não fumava. Como tiveram oportunidade de ler num dos meus primeiros textos, nessa altura já jogava poker online. Em Janeiro, combinei com um amigo que estudava em Aveiro e fui ter com ele durante uma semana. Fazíamos as nossas sessões de poker online, conheci alguns dos melhores jogadores portugueses na altura. Foi uma semana em que praticamente só jogávamos. Na altura até corria bem.
Num desses dias, numa dessas sessões de poker, durante a tarde, estava a jogar um torneio que me estava a correr super bem e que me podia dar bastante dinheiro. Estava super nervoso e ansioso. O meu amigo fumava, eu não. Mas, houve um momento nesse torneio, em que perguntei ao meu amigo se podia fumar um cigarro dele. Ele não me queria dar, mas acedeu ao meu pedido.
Conclusão: passaram 14 anos e esse cigarro bastou para que continuasse a fumar até hoje. Toda a adrenalina, emoção de estar a jogar aquele torneio de poker, fez-me pedir um cigarro.
Como disse, o jogo online, não é só aquele momento em que estamos “vidrados” a jogar, é tudo o resto também. E esse “resto”, por norma não é nada positivo.
Quantos já não passaram por esta situação? Fizeram uma aposta e perderam no último jogo? Jogaram um torneio de poker e ficaram no último lugar que não dava lugar a prémio (o chamado bubble)? Compraram um bónus numa slot e ela nem devolveu 80% do valor? E qual foi a vossa reação? Quantos já reagiram de forma explosiva num destes exemplos? Desde gritos, a socos nas paredes?
São tudo reações causadas por tudo o que advém daquele momento em que estamos a jogar, mesmo que sejamos pessoas calmas na maioria das vezes.
O jogo não traz nada de positivo, quer financeiramente, quer emocionalmente, por isso…
Digam não ao jogo. Digam sim a uma vida normal.
(Se algum de vocês está a passar por uma fase complicada relacionada com este tema e precisar desabafar, podem entrar em contato comigo. Ninguém está sozinho.)